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Salsichão Tainha em Curitiba, dias 08 ao 13/06! Ativação do Erro Grupo nos espaços cartografados da cidade da Cia. Silenciosa e do sorriso mais bonito. Mas não é só de beleza que é feita a nossa Curitiba. Tensão e tesão! Um pornosuspense no subturismo!
confessions
24 junFaziam-nos dormir de dois a dois, pés com cabeça, em caminhas. Eu me via sempre obrigada a dividir minha cama com aquele retardado do Jenö, o filho do padeiro e nosso vizinho de andar. Parecia um autêntico leitãozinho, limpo e rosado, com uma cabeçorra redonda e cheia de espinhas. Cheirava a levedura, e suas calças eram remendadas na bunda com pedaços de todas as cores. O garoto não dormia, virava-se de um lado para o outro e só dizia imbecilidades, blasfemando enraivecido. Eu não podia pregar o olho. Então, eu tirava a calcinha, segurava sua cabeça com as duas mãos e o forçava a encostar sua boca em minha xereca, minha cicciolina. Às gargalhadas eu dizia: “Cala a boca, imbecil, e sopra.”
E ele soprava. Depois parava, levantava sua cabeça vermelha e choramingava:
– Não aguento mais soprar! Está abafado e com cheiro de xixi.
– Xixi? Imbecil. Cala a boca e sopra…
Esse joguinho me agradava muito. Sentia coisas gostosas e tinha vontade de fazer xixi. Então eu fazia uma cara zangada e dava uns socos na cabeça dele para obrigá-lo a continuar. E ele recomeçava a soprar na minha cicciolina de garota. Eu tinha cinco anos.
Um dia, a professora nos pegou em meio a uma briga e substituiu o garoto por Ildiko, a filha do açougueiro, uma gordinha com tranças que cheiravam a manteiga e chucrute. Logo pedi-lhe que soprasse na minha fendinha, mas a garota, danada, enfiou a língua. Ela acariciava minha barriga e me pedia que fizesse o mesmo. Um dia, aquela sacaninha trouxe para a escola um salsichão que escondera na merendeira. Ela me ofereceu um pedaço. Peguei o salsichão pela ponta e o enfiei todinho na sua cicciolina. Ela desandou a berrar como um porco capado. Depois das chineladas e da bronca da professora, fui expulsa da escola.
Em casa, apanhei de novo e fui mandada para a cama sem jantar. Nossos jogos de criança, embora um pouco audaciosos, eram ainda inocentes. Não passavam de brincadeiras de crianças sabidas, estripulias de infância que me deixam boas lembranças.
No entanto, tantas sensações, tantos acontecimentos se apagaram de minha memória! Coisas bonitas ou tristes, lembranças que procuro reconstituir, arrumar ao meu jeito, enriquecer, encontrar-lhes uma continuação. Quando um detalhe isolado ressurge de improviso, tudo se torna então mais verdadeiro do que o real, e me sinto inundada de alegria.
CICCIOLINA. Confessions. Trad. P. C. Xavier. Rio de Janeiro: Record, 1987. Pg. 16 e 17.
ANDAMENTOS ATÉ AQUI
12 junA experiência tirada da segunda passagem do ERRO Grupo por Curitiba para o SalsichãoTainha terá sido incrível e esclarecedora. As ações de ativação dos espaços (e possíveis mediações da presença humana através de tecnologias digitais contemporâneas de uso recorrente) cartografados em sua passagem anterior pela capital paranaense englobaram visitas a espaços teatrais oficiais da cidade, praças no centro da cidade e propostas cênicas que buscam problematizar as conexões entre espaços públicos e privados, interferências nos fluxos desses ambientes e propiciar a relação das diversas presenças sociais envolvidas e midiatizadas nesses fluxos. Em uma fria e ensolarada quarta-feira 8/06, a Companhia Silenciosa recebeu o grupo florianopolitano em dia de jogo, Coritiba (3) e Vasco (2), da primeira final da Copa do Brasil. O hotel previsto para a hospedagem (e futuramente para as ações artísticas conjuntas) do grupo estrangeiro havia sido completamente tomado por integrantes da torcida vascaína. Boquiabertos e realocados em outro hotel, dessa vez unicamente para fins sumários de hospedagem mesmo, o grupo aguarda o meio dia do dia seguinte, que é quando o hotel previsto teria seus quartos almejados livres para o ensaio e a confabulação de cúpula das ações. A Companhia Silenciosa entra em contato com o roteiro de ações proposto pelo grupo visitante, intitulado PORNOSUSPENSE. Aforismos relativistas à parte, as “atrizes” (para não citarmos suas outras qualidades, intrínsecas e extrínsecas) da Silenciosa gostam muito do papel de atrizes, tem satisfação e comprazimento naquilo. O ator da Silenciosa também atua como “produtor” (para não nos atermos em suas outras funções sociais ou titulações). Há entre nós o desejo do contato, estamos experimentando a convivência e absorvendo a tainha por algum canto onde a salsicha, agora, não poderá entrar. Sim, nós temos um gráfico de ações! Estamos em terras brasileiras, temos futebol por perto, temos torcidas enlouquecidas e muitas vezes xenófobas. Estamos diante do maior império teatral da cidade, o prédio do Centro Cultural Teatro Guaíra, que a tudo acompanha em silêncio sem nada poder oferecer; pedimos autorização para utilização do espaço para filmagens e parte das ações, que nos foi negada: trata-se, agora, de apenas um lindo teatro antigo e mal cuidado, outrora glamouroso, transformado em edifício de funcionarismo público contemporâneo. Na manhã da quinta-feira 9/06, rumamos todos para uma ação inusitada no Grande Auditório do Teatro Positivo, lugar gracioso, belo e meticulosamente construído para uma grandiosa cena teatral à grega. A equipe gerenciadora deste teatro — privado, vale lembrar — nos autorizou de imediato a utilização de seus espaços internos para a filmagem do vídeo pré-gravado componente do roteiro de PORNOSUSPENSE. Um palco, uma plateia dócil e inexistente, cortinados e veludos apropriados, um tango e uma punhetinha furtiva. Lá fora o frio racha as peles polacas da região. À tarde todos fazemos entrada nos quartos do hotel onde o grupo está hospedado, local de parte de nossas ações programadas para o dia seguinte. Temos contato com a exorbitante quantidade de fiações por onde obteremos energia para o funcionamento de nossa tecnologia, ainda não inteiramente dominada. Também recebemos mais instruções para o funcionamento dos nossos corpos dentro dessas ações, nossos corpos, porém, são de uma tecnologia um pouco mais dominada, talvez porque nos seja inerente, mas só talvez. Nossos roteiros trazem informações como “a verdade está do outro lado”, “o que está longe pode vir a ficar perto”, Cicciolina, pizza, flâmula italiana, áudios do Google Tradutor, cenas de banheiro, dança, higiene pessoal, público dentro de um dos quartos, gente dormindo, camareiras, projeção de imagens íntimas através da janela de outro dos quartos, pratos com leite, bondage, masturbações (intelectuais e físicas), boneca inflável na marquise, atrito físico, denúncias de vandalismo, invasões calculadas, fumaça espetaculosa, Humphrey Bogart, James Dean e, claro, um belo e acintoso salsichão local. Câmeras, computadores e sites de relacionamento social na internet mediam tudo, a tudo olham e a tudo gravam, parodiam tudo, extrapolam tudo e a tudo contem. O PORNOSUSPENSE, realizado com uma hora de atraso (a tecnologia humana também falha), às 19 horas da sexta-feira 10/06, aliviou nossa tensão. Tivemos, com ele, um meio de pôr para fora o tesão grupal recolhido, na primeira ação artística inédita e conjunta realizada entre ERRO Grupo e Companhia Silenciosa depois de oito anos de namoro e rusgas à distância. A gozada foi boa, porém.
No meio dia do sábado 11/06 seguinte, nós nos encontramos relaxados, participativos e opinativos para uma conversa muito esclarecedora dos rumos em questão nesse nosso intercâmbio sulista. Surgiram-nos questões chave como: teatro, performance art, teatro dramático e teatro pós-dramático, lugar de onde se vê, lugar de onde não se vê, reação física ativa do espectador, espetáculo, arte diluída no cotidiano, visibilidade X invisibilidade como posicionamento político, características das funções próprias dos atores, características das funções próprias dos performers, características das funções próprias dos atores/performers, características das funções próprias dos diretores, características das funções próprias dos produtores culturais, características das funções próprias da equipe técnica, características das funções próprias de quem mistura todas as funções anteriores, semelhanças e diferenças no funcionamento interno de ambos os coletivos, machismo, feminismo, sexismo, heterossexismo, gêneros (biológicos e artísticos), sexualidade, delimitação de fronteiras entre linguagens e a subsequente desaparição dessas delimitações fronteiriças. Nosso SalsichãoTainha está crescendo a olhos vistos!
Às 15 horas do mesmo sábado, o ERRO Grupo realizou uma explanação para a comunidade local interessada sobre os temas e as articulações artísticas trabalhados no coletivo desde seu surgimento até seu momento atual. A conversa, de caráter informal, contou ainda com a apresentação de vídeos (demonstração de trabalho) e distribuição de programas de ações artísticas anteriores e mostras dos modos de produção com os quais o grupo trabalha e se relaciona. A Companhia Silenciosa está silenciosa, absorvente, e se prepara para sua próxima passagem pela capital do Estado de Santa Catarina no final da segunda metade do mês de julho próximo, quando realizará seu quinhão das ações artísticas previstas por este projeto. De minha parte (aqui anônima e subversiva) posso dizer que já estamos sentindo falta dessas coisas de que, em tão pouco tempo, somos capazes juntos. Quem viver verá!
AGORA!
11 junAgora!!
Erro Grupo abre tudo em conversa no Danny Snooker!
Daqui vemos o Bondinho da Rua VX.
Até às 18h.
PORNOSUSPENSE
24 maioSalsichão Tainha em Curitiba, dias 08 ao 13/06! Ativação do Erro Grupo nos espaços cartografados da cidade da Cia. Silenciosa e do sorriso mais bonito. Mas não é só de beleza que é feita a nossa Curitiba. Tensão e tesão! Um pornosuspense no subturismo!
Manifesto Pela Troca de Carícias
28 marParte 01. Da libertação do espetáculo.
Queremos enaltecer a espetacularidade como estratégia de burla à ditadura da funcionalidade, do clientelismo e do controle. O espetáculo como uma fresta na malha cinza de dióxido de carbono, dos shoppings centers, dos binários e postos de informação turística. A cidade voltada para o norte, organizada segundo a ordem e o progresso, segundo a economia, que é a desculpa reguladora de todas as ações depredatórias – do ambiente e das relações.
No início do século XXI já superamos o controle exercido sobre a espetacularidade, através de sua manipulação artística. Se antes o espetáculo pairava na mão de capitalistas interesseiros, hoje nós que já estamos bem alfabetizados dentro dessa cartilha, podemos escrever com as mesmas letras outras narrativas e sensibilidades.
A crítica de Debord não se aplica ao espetáculo que nós carinhosamente defendemos. A espetacularidade burlada, burlesca, suscita a participação total através da liberação do movimento irrefreável do desejo. Somente a força brutal e arrebatadora do desejo é capaz de criar novas paisagens existenciais, novos mundos a serem habitados, e novos sentidos ao nosso velho mundo obsoleto e hostilizado.
A hi low tech apropriada, a presença mediada, as conexões virtuais, só servem ao espetáculo do desejo se suprirem a demanda do contato e da troca de carícias. Se puderem e quando puderem ampliar o sentido do encontro.
A manipulação da auto-imagem também não precisa mais ser vista como produtora de mero simulacro. Quando modifico minha imagem estou também modificando o contexto na qual ela está inserida, ampliando sensibilidades. A auto-manipulação aproxima vida e arte, quebra a lógica da cena controlada, e propõe o encontro através da dúvida, do deslocamento, do rompimento das identidades fixadas.
Cremos ser essas algumas vias para que todos sejamos produtores-consumidores de arte. Apropriando-nos dos meios antes restritos, promovendo o sentido do encontro, manipulando imagens, ampliando a presença.
O empoderamento pelo espetáculo: um espetáculo no qual todos somos co-autores, e que podemos usar para escapar ao controle cotidiano, normativo, cinza e binário.
Curitiba, 27 de março de 2011.
(leitura realizada no vão do MON, pois estava chovendo e não foi possível ficar no gramado).